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Ocupação histórica do Cerrado é tema de Conferência no México

Sandro Dutra destaca que pesquisas geográficas inserem Goiás nos estudos Latino-Americanos em Ciências Ambientais

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09 de julho de 2023

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Sandro Dutra e Silva tem licenciatura em História pela Universidade Estadual de Goiás, mestrado em Sociologia pela Universidade Federal de Goiás e doutorado em História Social pela Universidade de Brasília, seguido de um vasto currículo que inclui ainda o pós-Doutorado pela Universidade de Brasília e pela University of California, Los Angeles. Na última semana, ele ministrou a conferência magna ‘Geografia e História Ambiental na América Latina: estudo sobre o Brasil Central na primeira metade do século XX’, durante XI Simpósio da Sociedade Latino-Americana e Caribenha de História Ambiental no México. 

O pesquisador é professor Titular na Universidade Evangélica de Goiás, e também Pró-Reitor de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Ação Comunitária da instituição; é professor efetivo na Universidade Estadual de Goiás, atua nos Programas de Pós-Graduação em Ciências Ambientais (mestrado e doutorado) nas duas universidades, desenvolve pesquisas na área de História Ambiental, com ênfase na expansão da fronteira agropecuária no Brasil Central. 

Em entrevista ao DM Anápolis, ele fala um pouco sobre sua pesquisa relacionada à ocupação histórica do bioma Cerrado, com ênfase na Colonização, Migração, Revolução Verde, Desenvolvimento Agronômico, Instituições Agropecuárias, Fronteira da Soja, Desmatamento e Histórias Animais no Bioma Cerrado. E anuncia o seu próximo livro, que inicialmente será publicado em língua inglesa. Sandro Dutra é um dos organizadores da coletânea de História Ambiental, volumes I, II e III (Garamond, Rio de Janeiro) e autor do livro "No Oeste, a terra e o céu: a expansão da fronteira agrícola no Brasil Central" (Mauad X: Rio de Janeiro).

Inicialmente, durante palestra no México, o senhor falou sobre o seu primeiro livro, ‘No Oeste, a terra e o céu: a expansão da fronteira agrícola no Brasil’. O que é o conceito Oeste?

O governo Vargas concebeu o conceito de Oeste como uma ficção geográfica. O termo “sertão” era o mais comumente utilizado pela teoria social brasileira para designar o interior do país. Ao invés de uma marcha para o sertão, que poderia significar um movimento em direção ao incerto, a invenção do Oeste considerava uma geografia imaginária, pois nem sempre as migrações foram de Leste para Oeste; ela poderia ser de Sul para Norte; ou de Sul para Noroeste ou de Sul para Nordeste, se você for considerar de onde partiam estes imigrantes. Essa marcha marcou as migrações entre as décadas de 1940 a 1960. Esse é um tema fascinante de deslocamento demográfico e que aconteceu anterior aos processos de conquista agronômica do Cerrado, ocorridas a partir da década de 1970. Mas é uma história ambiental exuberante, pois considera também a invenção do Brasil Central, como uma terra prometida; uma terra de prosperidade, do ponto de vista de doação de terras; da política da Marcha para Oeste. Goiás foi o epicentro dessa política. Isso no final da década de 30, quando o Governo Federal criou as colônias agrícolas nacionais e Goiás foi a primeira delas, na região de floresta tropical, que é um ecótono florestal virtuoso encravado no meio do Cerrado, conhecido na época como Mato Grosso de Goiás. Na parte norte dessa grande floresta tropical localizava-se as matas de São Patrício, que foi a área doada pelo governo goiano para a instalação da colônia agrícola. 

Qual o contexto e a narrativa da época?

O Mato Grosso de Goiás já era muito mencionado na historiografia goiana da época. Mas era uma área que não despertava interesse e nem conflitos fundiários. Isso porque, era uma área de difícil ocupação, com dispendiosos custos de desmatamento e não havia uma logística para escoamento de grãos e outros produtos agrícolas produzidos nessa região. Com a chegada da ferrovia em Anápolis em 1935, a abertura de novas estradas para a região e sobretudo da criação da Colônia Agrícola em 1941, intensificou-se um deslocamento demográfico e o povoamento dessa região, com o surgimento de zonas rurais e urbanização na região, como Ceres, Rialma, Goianésia, Rubiataba, Uruana e muitas outras cidades surgidas na região das matas de São Patrício, também conhecido como Vale de São Patrício. E a consequente ocupação, como abordado em nossas pesquisas, resultaram na destruição quase total dessa floresta única.  

Este foi o ponto central do seu livro?

Sim, meu objetivo inicial de pesquisa foi conhecer as características históricas, geográficas e ecológicas dessa grande floresta. Na verdade, a geografia e a ecologia acabam se tornando ciências com narrativas históricas, quando pensamos em história ambiental. A região de Ceres e Rialma, e todo o processo de colonização desta grande floresta foi meu principal interesse. E a relação entre campo e cidade, mundo urbano e rural e suas relações históricas de interdependência são meu principal interesse dentro da História Ambiental que eu trabalho. E do ponto de vista teórico esse tema tem sido discutido a partir do conceito da fronteira, como uma região de colonização e migração pioneira. A minha história ambiental do Cerrado começa não nas áreas mais comuns e dominantes desse bioma, que são os campos (limpos, sujos e cerrados), mas uma área muito específica e única, que é este grande capão de floresta tropical, conhecido na época como o Mato Grosso de Goiás. Um geógrafo do Conselho Nacional de Geografia chegou a denominar essa grande área florestal como a Zona da Mata Goiana. 

O senhor apresentou este livro e anunciou o próximo?

Eu precisei retomar esse contexto histórico de colonização pioneira do Oeste, seus elementos históricos e simbólicos de ocupação demográfica e agrícola para posteriormente apresentar o meu projeto para o novo livro em andamento. Eu fiz uma apresentação do próximo livro, que tem previsão de ser publicado inicialmente em inglês, pelo acordo feito com uma editora de Cambridge com quem estou conversando previamente. Na verdade, o projeto prevê a tradução de parte do primeiro livro e a inclusão de novos capítulos adicionais, que são essa parte inédita que ainda estou trabalhando nela. Inicialmente, Minha ideia é atualizar os capítulos já publicados e adicionar mais quatro ou cinco capítulos, em que vou apresentar o papel dos geógrafos americanos, que na década de 1940 e 1950, fizeram pesquisas de campo em Goiás. 

Qual objetivo desta nova publicação?

Meu objetivo é historicizar essa história ainda desconhecida do grande público, descrevendo quais as razões que motivaram a vinda de tantos geógrafos ligados a importantes universidades americanas. A maior parte das minhas fontes documentais estão nos arquivos e coleções especiais dessas universidades nos Estados Unidos. O trabalho tem sido coletar e analisar o que eles descreviam como processos de conquistas no Brasil central, a grande fronteira do coração geográfico do Brasil, que envolviam não apenas processos de colonização, mas também a comprovação de várias teorias geográficas desenvolvidas sobre os eventos de expansão da fronteira. Na verdade, meu argumento tem mostrado que Goiás era um importante laboratório vivo para a colonização pioneira, colonização, de um Oeste distante em ocupação rural e urbana. Na verdade, seria uma forma de compreensão de um fenômeno histórico que já havia ocorrido nos Estados Unidos um século antes, com a ocupação do grande Oeste. E no Brasil, em particular em Goiás, esse laboratório geográfico era vivo e contemporâneo desses geógrafos. 

Além de conferencista, o senhor ainda teve uma participação como integrante da Junta Diretiva da Sociedade Latino-americana de História Ambiental. Qual a importância disso?

Bom, eu já fazia parte da junta de SOLCHA desde 2019, por ser editor chefe da revista da Sociedade, a revista HALAC, em parceria com a pesquisadora argentina Marina Miraglia. E na mudança do conselho gestor eu continuo como editor. Eu entendo que é uma confiança do atual presidente que assume, e também da assembleia da Sociedade que deseja a manutenção dos trabalhos editoriais que estamos desenvolvendo na revista. Nossa revista está entre as de maior impacto no campo da história, não apenas na América Latina, mas também em escopo global. Eu me sinto muito grato e também realizado por cumprir essa missão e auxiliar na divulgação da pesquisa qualificada sobre a história ambiental latino-americana. E nesse sentido, o apoio institucional também tem sido fundamental. Não apenas de SOLCHA, mas também da Universidade Evangélica de Goiás, por meio da sua Editora, que sedia e apoia os trabalhos editoriais da nossa revista. Esse foi também um ponto que eu ressalto na participação no evento, a valorização do trabalho editorial desenvolvido no Brasil e em uma universidade goiana. O apoio da mantenedora e da Reitoria, com uma estrutura fantástica que temos na UniEVANGELICA, tem possibilitado termos revistas hospedadas e que conseguem fazer o melhor trabalho editorial que temos disponíveis.  

 

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