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Literatura e meio ambiente – um importante diálogo

Simone Athayde é pós-graduada em Língua Portuguesa, graduada em Letras e em Odontologia, membro da União Literária Anapolina (ULA), União Brasileira de Escritores e da Academia Anapolina de Letras. Ela presenteia os leitores do Baru, com este texto sobre Literatura e Meio Ambiente.

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25 de setembro de 2023

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Simone Athayde

Desde que o homem começou a utilizar a arte como expressão objetiva ou subjetiva de suas vivências sociais, a natureza foi sempre um elemento importante. Das pinturas rupestres, que retratavam os animais e as cenas de caça até a arte pós-moderna, o meio ambiente, agora tão profundamente modificado, sempre foi fonte de inspiração para diversas categorias e objetivos artísticos.

Na história da literatura, em todas as chamadas escolas literárias, ela aparece como cenário, às vezes para rodear o homem com sua magnitude e beleza, outras vezes como um obstáculo a ser vencido. No Arcadismo, por exemplo, os poetas deviam seguir em seus versos os critérios do locus amoenus (local ameno) e do urbem fugere (fuga da cidade), ou seja, era no campo, em meio à natureza, que o homem haveria de encontrar o cenário ideal para sua felicidade. 

Podemos dizer que foi no Romantismo que a Natureza se tornou uma espécie de protagonista, que seu valor, sua beleza e sua importância se elevaram a um patamar antes nunca atingido. Os escritores do chamado Romantismo viam na natureza a idealização de uma visão superior de vida, mas, por sua grandiosidade, podia ser também um elemento de perdição. Assim, a visão do meio natural mudava conforme as mudanças dos personagens. Um bom exemplo dessa visão romântica encontra-se no clássico Os sofrimentos do jovem Werther, do alemão Johann Goethe, considerada a obra fundadora da escola Romântica. No início, o personagem Werther está feliz, entusiasmado e cheio de esperanças com sua nova etapa de vida num distrito rural, por isso vê a Natureza com uma profunda reverência que ele reserva para todos os elementos e formas de vida, até para as criaturinhas minúsculas que habitavam o chão das florestas: Quanto ao resto, sinto-me aqui perfeitamente bem. A solidão, neste verdadeiro paraíso, é um bálsamo para o meu coração sempre fremente, que transborda ao calor exuberante da primavera. Cada árvore, cada sebe forma um tufo de flores, e a gente tem vontade de transformar-se em abelha para flutuar neste oceano de perfumes e deles fazer o único alimento. 

Porém, à medida que o personagem começa a passar por sofrimentos emocionais, sua depressão também transparece na sua visão do meio ambiente, que se torna opressor:  Por que é que aquilo que faz a felicidade do homem acaba sendo, igualmente, a fonte de suas desgraças? O intenso sentimento do meu coração pela natureza em seu esplendor, sentimento que tanto me deliciava, transformando em paraíso o mundo que me cerca, tornou-se para mim um tormento intolerável, um fantasma que me tortura e persegue por toda parte.

Por aqui, no Brasil, ainda no Romantismo, é famoso o poema Canção do Exílio, de Gonçalves Dias, que cantava em tom ufanista e saudoso as nossas belezas naturais. Já Castro Alves, no belíssimo poema Navio Negreiro, faz um paralelo entre as maravilhas e os perigos do oceano com os horrores impingidos aos escravizados torturados nos porões de um navio vindo da África: “Senhor Deus dos desgraçados!/ Dizei-me vós, Senhor Deus!/ Se é loucura... se é verdade/ Tanto horror perante os céus?!/ Ó mar, por que não apagas/ Co’a esponja de tuas vagas/ De teu manto este borrão?.../ Astros! noites! tempestades!/ Rolai das imensidades!/ Varrei os mares, tufão!”

Ao fazermos um pulo temporal, passamos para a fase do Modernismo, quando vemos, em Vidas Secas, a questão crucial da seca no sertão nordestino, numa relação direta com o coronelismo: ambos são elementos que levam a miséria aos pequenos agricultores. 

Nos tempos atuais, um dos fortes temas da literatura é a questão do perigo que ronda a natureza devido às destruições provocadas pelo sistema capitalista. A visão pessimista de um futuro próximo no qual a humanidade, depois de um período predatório sem controle, talvez tenha que lidar com a falta de água, com êxodos climáticos e com extinções em massa, faz com que os autores explorem essa temática como forma de catarse, de denúncia ou de chamamento para uma mudança de atitudes. 

Na chamada literatura de ficção, o livro A estrada, do premiado Cormac McCarthy, se passa no mundo pós apocalítico, quando “todas as árvores caíram”. Já na não-ficção, temos nomes como Ailton Krenak, filósofo, ativista e ambientalista que, vindo dos povos originários, ergue-se como voz importante nessa luta pelo meio ambiente, no qual os homens e sua sobrevivência estão inseridos. Krenak é autor, entre outros, dos livros Ideias para adiar o fim do mundo e O mundo não é útil.

Seja como cenário ou como personagem, seja para ser venerada ou para ser defendida, a natureza, como aquilo que nos cerca e nos oferece vida, será sempre um dos temas influenciadores da matéria literária, através da qual estaremos sempre a redescobrindo. 

 

  

 

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